Estas recomendações são traduções para a língua Portuguesa das versões leigas das recomendações da European League Against Rheumatism (EULAR). As publicações originais podem ser encontradas no website da EULAR

As recomendações EULAR têm como objetivo aconselhar doentes, médicos e outros profissionais de saúde quanto à melhor forma de tratar e lidar com as diversas doenças reumáticas. Recentemente a EULAR atualizou as suas recomendações relativas ao tratamento e acompanhamento do doente com artrite psoriática (frequentemente abreviada para AP). A artrite psoriática é uma doença em que o sistema imunitário ataca os tecidos do próprio corpo causando
inflamação. Isto provoca rigidez, dor e dano das articulações. Muitas vezes esta doença surge juntamente com uma doença de pele designada psoríase. A psoríase da pele e a artrite psoriática não são contagiosas, o que significa que não se transmitem de uma pessoa para outra.

Estas recomendações resultam do esforço conjunto de doentes, médicos e outros profissionais de saúde. Ao incluir doentes na equipa pretendemos assegurar que o ponto de vista do doente também é tido em consideração. A informação aqui presente relativa ao tratamento da artrite psoriática, baseia-se no conhecimento científico mais atual.

Tipicamente, o tratamento da artrite psoriática baseava-se no que já sabíamos relativamente ao tratamento da artrite reumatoide – no entanto, existem diferenças entre as duas doenças. Hoje em dia, existem muitos estudos acerca da artrite psoriática e, apesar de ainda não ter uma cura conhecida, têm surgido novos medicamentos para o seu tratamento. Por isso mesmo, as recomendações EULAR de 2011 foram atualizadas.

Estas recomendações incluem informação acerca de diferentes medicamentos utilizados no tratamento da artrite psoriática. Podemos agrupar estes  edicamentos em quatro grupos:

  • Anti-inflamatórios não-esteroides (AINEs): estes medicamentos apenas servem para aliviar os sintomas.
  • Medicamentos modificadores da doença (DMARDs): alteram a evolução natural da doença ao reduzirem a inflamação. Estes medicamentos podem prevenir as crises e a progressão da doença. Também podem ajudar a melhorar o funcionamento e a impedir a destruição das articulações. Existem vários tipos:
    • Medicamentos modificadores da doença convencionais;
    • Medicamentos modificadores da doença biológicos (ou simplesmente biológicos);
    • Medicamentos modificadores da doença dirigidos.

Cada grupo de medicamentos atua de forma diferente no tratamento dos sinais e sintomas da doença. Por exemplo, os biológicos atuam bloqueando uma molécula causadora de inflamação. Este bloqueio leva à redução da inflamação que, por sua vez, conduz a um melhor controlo da doença.

No total existem 5 princípios gerais e 10 recomendações. Os princípios gerais defendem que a artrite psoriática é uma doença muito variável de pessoa para pessoa e potencialmente grave que pode necessitar de tratamento por diferentes especialistas.

O tratamento do doente com artrite psoriática deve ser o mais rigoroso possível e deve basear-se sempre numa decisão conjunta entre o médico e o doente. O médico mais apto para lidar com a artrite psoriática é o reumatologista. Caso existam outros sintomas, pode ser necessária a colaboração de outras especialidades, por exemplo, do dermatologista se houver envolvimento da pele. O principal objetivo do tratamento da artrite psoriática é garantir ao doente a melhor qualidade de vida possível com, o mínimo de dor, mas também, prevenir a destruição irreversível das articulações que leve à incapacidade de executar as tarefas do dia-a-dia. A escolha do melhor tratamento para cada doente deve, ainda ter em conta, outros problemas de saúde que este possa ter, por exemplo, doenças do coração, diabetes, entre outras.

Para além dos princípios gerais existem 10 recomendações. Cada recomendação baseia-se em estudos científicos existentes até à data ou na opinião dos peritos na área. Quanto mais estrelas (*) uma recomendação possui, maior a evidência científica. É importante que, quer o doente, quer o médico, as conheçam e respeitem.

Uma estrela (*) significa pouca evidência.
Duas estrelas (**) significa alguma evidência.
Três estrelas (***) significa bastante evidência.
Quatro estrelas (****) significa forte evidência.

  • O objetivo do tratamento deve ser a remissão ou uma baixa atividade da doença; a vigilância e o ajuste da medicação regulares são a melhor forma de alcançar estes objetivos. ****
    O objetivo do tratamento deve ser a remissão ou uma baixa atividade da doença. Remissão significa que a doença está bem controlada, ou seja, que não existe qualquer inflamação, quer nas articulações, quer nas análises sanguíneas. No entanto, alguns sintomas podem estar presentes mesmo estando em remissão. Baixa atividade da doença significa que os níveis de inflamação são mínimos. O médico pode ajudar a alcançar estes objetivos mantendo uma
    vigilância apertada através da observação das articulações e do resultado de exames realizados. O médico pode ainda aumentar ou reduzir a intensidade do tratamento, consoante a necessidade.
  • Os anti-inflamatórios podem ser utilizados. ****
    Os anti-inflamatórios são úteis no alívio das dores articulares e musculares. Podem aumentar a mobilidade das articulações, mas não impedem a progressão da doença, nem a destruição das articulações. Estes medicamentos não protegem as articulações, nem têm benefício a nível da pele.
  • Os fármacos modificadores da doença convencionais devem ser introduzidos o mais cedo possível em doentes com artrite (inflamação das articulações) dos braços, mãos, pernas, pés ou outros sintomas. ***
    A artrite pode afetar grandes articulações (cotovelos, joelhos, punhos) ou pequenas articulações (mãos e pés) – artrite periférica. Nestes casos, os fármacos modificadores da doença convencionais devem ser considerados desde o início, principalmente se a doença envolver um grande número de articulações ou outros órgãos, por exemplo, os olhos. De entre este tipo de fármacos, o metotrexato é o preferido, principalmente se também houver lesões na pele.
  • As infiltrações à base de cortisona devem ser consideradas. Os corticoides orais podem ser utilizados com o devido cuidado e na dose eficaz mais baixa. **
    Injeções locais à base de cortisona (nas articulações ou junto aos tendões) podem ser utilizadas para alívio das dores nos doentes com artrite psoriática. Os corticoides tomados por outras vias, por exemplo, em comprimido, em regra não são recomendados, mas podem ser utilizados em
    situações pontuais e com os devidos cuidados na dose eficaz mais baixa.
  • Os medicamentos biológicos são uma opção em doentes com artrite periférica que não respondem aos fármacos modificadores da doença convencionais. ***
    Se o doente tem artrite periférica e não apresentou melhoria com o tratamento à base de fármacos modificadores da doença convencionais, mantido, pelo menos, durante alguns meses, pode beneficiar com medicamentos biológicos. Neste caso, os mais utilizados são os inibidores do fator de necrose tumoral (TNF) por serem os mais estudados e com mais anos de experiência no mercado. Estes medicamentos funcionam através do bloqueio de uma molécula chamada TNF (do inglês “tumor necrosis factor” ou factor de necrose tumoral). O TNF está envolvido no processo de inflamação.
  • No caso de existir artrite periférica, se os inibidores do TNF não puderem ser utilizados, existem outros medicamentos biológicos que bloqueiam outras moléculas da inflamação que podem ser utilizados. ***
    Se o doente tiver artrite periférica e não puder tomar inibidores do TNF por qualquer razão, pode ser utilizado um medicamento biológico que bloqueie uma molécula diferente. Alguns destes medicamentos acabaram de entrar no mercado e parecem funcionar tão bem como os inibidores do TNF.
  • Na artrite periférica, se os medicamentos biológicos estiverem contra-indicados, podem ser utilizados os fármacos modificadores da doença dirigidos . ***
    Se o doente tem artrite periférica e não puder tomar medicamentos biológicos por qualquer razão, podem ser utilizados fármacos modificadores da doença dirigidos. Este tipo de medicamentos funciona de forma diferente dos medicamentos biológicos. Para além disso, são tomados em
    forma de comprimido, enquanto os biológicos são tomados em forma de injeções subcutâneas ou infusões na veia.
  • Os medicamentos biológicos são uma opção em doentes com tendões e/ou ligamentos inflamados e em doentes com dedos em forma de salsicha. ***
    Se o doente tiver inflamação dos tendões e/ ou ligamentos ou inflamação dos dedos das mãos ou dos pés (também chamados dedos em salsicha), que não melhorou com a utilização de antiinflamatórios ou com infiltrações locais à base de cortisona, pode ser necessário o uso de medicamentos biológicos, mesmo que não tenha sido tentado previamente um fármaco modificador da doença convencional.
  • Os medicamentos biológicos devem ser considerados em doentes com atingimento da coluna. ***
    Se a doença afeta predominantemente a coluna e não melhora com anti-inflamatórios, um inibidor do TNF é uma opção, mesmo que não tenha sido tentado antes um fármaco modificador da doença convencional.
  • Se não houver melhoria dos sintomas com um biológico, o tratamento deve ser alterado. ***
    Se a doença não melhorar com um medicamento biológico, o tratamento deve ser alterado. Isto significa trocar para outro inibidor do TNF, para outro tipo de biológicos que atuem numa molécula diferente ou, em alguns casos, para um fármaco modificador da doença dirigido.

As recomendações revelam a existência de diversos tipos de tratamento disponíveis para a artrite psoriática. Alguns são mais benéficos do que outros para certas manifestações específicas da doença. Se sofre de artrite psoriática, estas recomendações poderão ajudar a compreender o que esperar do seu reumatologista e que tratamentos existem atualmente disponíveis para si.

Se tiver alguma dúvida ou preocupação relativamente à sua doença ou tratamento deve sempre discuti-la com o seu médico reumatologista.

Apesar da sua origem europeia, estas recomendações aplicam-se à realidade do nosso país. Uma exceção é feita para a utilização de fármacos modificadores da doença dirigidos. Este grupo de medicamentos encontra-se já em utilização em muitos países da Europa. Em Portugal também já foram disponibilizados, mas apenas muito recentemente começaram a ser utilizados. A falta de experiência nacional leva-nos a reservá-los para situações muito particulares, nomeadamente
situações em que os diversos tratamentos convencionais não foram eficazes.

Ramiro S, et al. Pharmacological treatment of psoriatic arthritis: a systematic literature review for the 2015 update of the EULAR recommendations for the management of psoriatic arthritis. Ann Rheum Dis;75(3):490–8. doi:10.1136/annrheumdis-2015-208466.

Realizada por: Mariana Luís
Serviço de Reumatologia, Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC)